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A água na produção animal: um nutriente esquecido?

Escrito por: Eduardo Miotto Ternus - Médico veterinário, graduado na Universidade do Estado de Santa Catarina, Mestre em Ciência Animal pela mesma instituição. Atuou na empresa BRF por 13 anos na área de Suinocultura passando pelas diferentes áreas de extensão rural nos setores de produção de leitões, terminação, central de inseminação, sistema Quarto Sítio. Veterinário Sanitarista, Supervisor da recria e terminação de suínos. Especialista Corporativo na área de Reprodução, Recria e Terminação de suínos. Desde 2019 atuando como Coordenador Técnico Suínos América Latina na Vetanco e Doutorando no Programa de Ciência Animal na Universidade do Estado de Santa Catarina (CAV/UDESC).

A água é um recurso natural fundamental para a produção animal, devendo estar disponível em quantidade e qualidade. Ela é utilizada:
Na produção dos insumos e dos alimentos;

Na dessedentação;

 Na higienização das instalações;

 No abate dos animais e

 No processamento dos produtos.

Não devemos esquecer, no entanto, que a água é um recurso natural finito, portanto, é dever de todos assegurar a oferta de água de forma sustentável.

 

A água é um elemento insubstituível no organismo dos animais, sendo sua finalidade fisiológica extensa. A presença de água nas células permite a forma e a função dos órgãos e estruturas do corpo. É o meio no qual ocorrem as reações metabólicas celulares e permite a transferência de nutrientes e a remoção de resíduos (LIMA, 2010). Está envolvido na regulação da temperatura corporal, lubrificação das articulações (via líquido sinovial) e proteção do sistema nervoso (via líquido cefalorraquidiano).

A água constitui a maior parte da composição corporal total dos suínos e a proporção de água no corpo muda com a idade. Constitui mais de 80% do peso corporal de um suíno de 1 dia de idade, mas em um suíno de 5 meses de idade a água representa cerca de 50% do peso corporal (THACKER, 2001).

A quantidade de água tem a mesma importância quanto a sua qualidade, sendo de extrema importância no processo produtivo, pois tem influência direta na nutrição dos animais pela sua composição e volume ingerido. No entanto, ainda não é frequentemente considerado um fator de impacto na produção, sendo uma maior atenção voltada para outros nutrientes da dieta. (RIBEIRO et al., 2017).

Comumente os nutricionistas se prendem apenas à qualidade e à composição química dos ingredientes para balanceamento de dietas de modo a suprir as exigências dos diversos nutrientes (proteína, fibra, gorduras, carboidratos, vitaminas e minerais), esquecendo-se da qualidade da água, nutriente tão importante quanto os demais.

De acordo com MARIA & ALBERTO (2009), para ter uma produção animal de qualidade deve-se dar à água importância semelhante à que se dá a outros fatores de produção como instalações e manejo. Fato é que, na prática, se percebe uma enorme preocupação com os parâmetros de qualidade da água ao consumo humano do que para a produção animal, sendo assim, os cuidados com a saúde animal são ignorados (BIRKHEUER et al., 2017).

Essa imprudência em relação ao uso de água de qualidade duvidosa pode interferir nos índices zootécnicos e na disseminação de enfermidades, acarretando graves prejuízos econômicos, além de carrear agentes patogênicos de doenças de interesse em saúde pública (MAGALHÃES et al., 2014).

Dito isso, a água pode e deve ser considerada o mais importante elemento potencializador das ações higiênico-sanitárias, desde que seja adequadamente tratada

No Brasil foram estabelecidos diversos parâmetros a serem respeitados, onde, segundo a resolução normativa nº 357 (CONAMA, 2005) que classifica as águas, de acordo com seu uso, definindo padrões de qualidade que devem ser atendidos, e ainda define que as águas destinadas à dessedentação animal devem estar dentro dos padrões exigidos para Classe 3.

Para o termo “qualidade da água” é necessário compreender que ele não se refere necessariamente a um estado de pureza, mas às características químicas, físicas e biológicas e que, conforme essas características, são estipuladas diferentes finalidades para a água (MERTEN & MINELLA, 2002).

Dados do IEPEC (2008) descrevem como água de baixa qualidade aquela que:
– Apresenta elevada acidez ou alcalinidade.
– Presença de sulfetos de hidrogênio, de sulfatos de ferro e manganês.
– Alto conteúdo de sólidos totais dissolvidos.

 

Com relação à contaminação destacam-se a alta contagem de bactérias (Coliformes fecais ou não, Streptococcus, Pseudomonas), população elevada de algas verdes ou azuis, presença de produtos químicos.

Elementos potencialmente tóxicos aos animais são:

– alumínio;
– arsênio;
– bário;
– boro;
– cádmio;
– cobalto;
– cobre;
– ferro;
– chumbo;
– mercúrio;
– níquel;
– selênio e
– zinco

A presença de parasitos na água por contaminação dos próprios animais também torna a água imprópria para consumo (NETTO, 2005). Além disso, indica má qualidade microbiológica geral da água e o risco de presença de agentes patogênicos de origem fecal, fazendo da água de dessedentação um fator de risco à saúde dos animais (PINTO et al, 2008).

A qualidade também não é estática no tempo, alterando de acordo com eventos ambientais como a chuva e/ou eventos humanos como o uso de fertilizantes. Assim, mesmo no caso de fontes de água subterrâneas como poços, a qualidade da água pode ser alterada, o que reafirma a necessidade de que seja feito o monitoramento periodicamente.

A análise somente no momento em que um problema for detectado significará maiores gastos financeiros para correção de algo que poderia ter sido evitado se houvesse a prática do monitoramento frequente. As análises microbiológicas têm a função de determinar a qualidade sanitária da água. As águas contaminadas podem contribuir para surtos de doenças, podendo ocasionar mastites, infecções do trato urinário, diarreia etc.

A recomendação é que toda água servida aos animais fosse clorada. Esse é um princípio de qualidade que o produtor não pode abrir mão sob pena de sofrer os prejuízos supracitados.

O cloro é um agente desinfetante que penetra nas células dos microrganismos presentes na água (especialmente bactérias) e reage com suas enzimas. Ao impedir que essas enzimas funcionem, o cloro destrói os microrganismos e desinfeta a água.

O cloro, quando aplicado corretamente, neutraliza 100% das bactérias em 20 minutos de contato. No entanto, o poder bactericida do cloro pode sofrer interferência de aspectos como pH, turbidez e dureza, entre outros

Por exemplo, pH 7, ou abaixo, promoverá ação desinfetante muito eficaz na neutralização de bactérias. Já acima de 7, a ação bactericida do cloro fica menor. 

Quando a água é ácida (↑ H +) há predominância de formação do HOCl (ácido hipocloroso). Quando a água é alcalina (↓ H +) ocorre uma reação de ionização, onde o HClO é quebrado em OCl- (íon hipoclorito) + ½ H +. Isto é muito importante porque o ácido hipocloroso (HOCl) e os íons hipoclorito (OCl) possuem eficiência germicida muito diferentes, pois a eficiência germicida do ácido hipocloroso (HOCl) é 80 vezes maior que do íon hipoclorito (OCl).

Desta forma, quando temos águas alcalinas, é de extrema importância fazer uso de ácidos orgânicos para a correção do pH da água assegurando desta forma a atividade germicida do cloro.

A preservação e o uso consciente dos recursos naturais têm sido cada vez mais debatidos, pois a humanidade já começa a sentir os efeitos do mau gerenciamento dos recursos naturais, sendo que os animais de produção são diretamente impactados pela quantidade e qualidade da água disponível em toda a cadeia produtiva. Por estes motivos cabe a todos nós o esforço conjunto na preservação e sustentabilidade deste bem tão precioso que é a água. 

Referências
Sob consulta do autor

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