Ícone do site suino Brasil, informações suino

China: recomposição do rebanho suíno a níveis de 98%, temos que olhar com cautela

Escrito por: Cândida Azevedo - Doutorado pela Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz"

O ministério da agricultura da China informou recentemente que seu rebanho suíno voltou a mais de 98% dos níveis anteriores ao surto de Peste Suína Africana (PSA), que dizimou mais de 40% do rebanho de suínos do país – que era de aproximadamente 420 milhões de cabeças. A recuperação vem bem antes do previsto, já que a China não estava projetada para concluir a reconstrução até 2023.

Rebanho suíno voltou a mais de 98% dos níveis anteriores ao surto de Peste Suína Africana (PSA)?

 

Diante dessas informações vários questionamentos foram levantados:

A China, de fato, acelerou a recomposição do seu rebanho de suínos?

O país conseguiu de fato conter a doença sem vacinação?

Como ficará o mercado nacional com a retomada da produção de suínos na China?

 

 

Para responder essas e outras perguntas, preparamos uma reportagem com decisores da cadeia produtiva de suínos, além disso, há informações de fontes da agroindústria na China.

 

Queda dos preços na China 

Segundo dados do Ministério da Agricultura e Assuntos Rurais da China, os preços da carne, do leitão e do suíno vivo estão em queda no interior da China. Em um relatório da Global Agricultural Information Network (GAIN), a equipe do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) citou a causa da queda nos preços da carne suína como resultado do ressurgimento da PSA na China no final de 2020.

Segundo o relatório: “O surto de PSA em 2020 fez com que os produtores demonstrassem maior preocupação com a propagação da doença. Como resultado, os produtores de suínos aumentaram a oferta, causando queda nos preços. Vale ressaltar que, de janeiro ao final de junho de 2021, os preços do suíno vivo registraram queda de quase 65% devido ao aumento do abate, à baixa demanda do consumidor e à abundância de carne suína no mercado.”

Analistas e pesquisadores chineses reiteraram as contribuições da PSA para a volatilidade do mercado de suínos. “Os preços foram atingidos devido ao aumento da produção após os surtos da PSA, que se move para reabastecer as reservas de carne suína do país”, destaca Wang Zuli, pesquisador adjunto da Academia Chinesa de Ciências Agrícolas (CAAS), à mídia chinesa afiliada ao estado Global Times.

Em um relatório emitido pela Reuters, Li Ming, analista da Myagric.com, ressaltou que os preços atuais do suíno de cerca de 15,6 yuans / kg (US $ 2,44) estão abaixo do ponto de equilíbrio para muitos agricultores, o que pode levar alguns à falência, e levar a um golpe substancial para fornecer mais tarde. “O risco é alto de que os mercados sejam bastante voláteis”, acrescentou.

À medida que o preço da carne suína diminuía, também observou uma redução no preço dos leitões. É relatado que as granjas de reprodução responderam com o abate de fêmeas reprodutoras menos produtivas, afetando ainda mais a produção de leitões. Os analistas esperam que a tendência diminua a população de reprodutoras para pequenos e médios produtores, ao mesmo tempo que apoia os grandes produtores com porcas de elevada eficiência.

Recorrência de PSA na China

No primeiro bimestre deste ano foram registrados casos da PSA em Hebei, Henan, Sichuan, Yunnan e Xinjiang. Recentemente, um grande número de suínos está morrendo em decorrência da PSA na principal província produtora de suínos da China, informaram agricultores e analistas, levantando preocupações de que a doença possa se espalhar ainda mais pelo sul do país e desacelerar a recuperação da produção local de carnes.

“A situação está muito séria em Sichuan recentemente”, afirmou Xiao Lin, analista do fundo de investimentos Win & Fun, de Shenzhen. A maioria dos impactados é composta por pequenos suinocultores, que relaxaram as medidas de prevenção à doença para reduzir custos após uma forte queda nos preços dos suínos nos últimos meses, acrescentou Xiao, que estimou as perdas em cerca de 10% a 15% do rebanho.

“Começou em junho e continua se espalhando”, informou um produtor no condado de Jingyan, que possuía mais de 30 matrizes suínas e centenas de animais antes de a doença atingir sua criação.

“Todos os suínos em fase de terminação contraíram a doença e morreram. Ainda há mais de cem leitões que também podem morrer”, disse ele à Reuters, pedindo para não ser identificado devido à sensibilidade do assunto.

Procurado, o Departamento Provincial de Agricultura e Assuntos Rurais de Sichuan não respondeu a um pedido de comentários.

Em fevereiro deste ano, a SuínoBrasil conversou com a Epidemiologista e Professora da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP a Dra. Masaio Mizuno, que esclareceu sobre a epidemiologia da PSA.

Como epidemiologista, a senhora acredita que seja possível estimar a recomposição do rebanho de suínos da China, tendo em vista as novas variantes, vacinas ilegais e pressão de outras doenças, particularmente a síndrome reprodutiva e respiratória suína (PRRS)?

Caso o sistema de criação de suínos permaneça inalterado, considero praticamente impossível porque reúnem todas as condições necessárias e suficientes para a persistência da PSA, tais como:

Certamente, a ocorrência de duas ou mais infecções ou doença intercorrentes principalmente em termos de saúde animal tem reflexos imediatos em razão dos prejuízos econômicos, porém mais importante é o potencial de disseminação das doenças no território chinês e países cincuncisos por se tratarem de doenças transfronteiriças, i.e, não respeitam fronteiras geográficas.

Como a PSA está ocorrendo na Europa e Ásia que são contíguos embora com diferentes níveis de incidências, os esforços para seu controle, uma vez que a erradicação se tornou impossível, o controle dependerá de um esforço conjunto respeitando as diversidades sociais, culturais, econômicas e perfil dos sistemas produtivo dos países, conclui a pesquisadora.

Cadeia global de carne suína

No fim de junho, as negociações de contratos futuros de suínos mais ativos na Bolsa Mercantil de Chicago caíram quase 17%, levando o preço para 99 centavos de dólar por libra-peso – a primeira vez que caiu abaixo de um dólar desde março. Os futuros registraram uma ligeira recuperação, subindo 3%, para US $ 1,03 a libra.

Os preços americanos de cortes de carne de suína – lombo ou costela – registraram uma queda acentuada nas últimas semanas. Os preços do lombo caíram 15% nos últimos 10 dias, enquanto as costelas caíram mais de 31%. O pernil suíno – comumente usado para churrasco – registrou uma queda de 14%, enquanto a barriga, usada para fazer bacon, caiu 18% nesse período.

Além dos Estados Unidos, a condição de preços baixos do suíno na China e recuperação do rebanho vem acendendo luzes de alerta em outros países exportadores, como Argentina e Espanha.

Segundo informações divulgadas pelo jornal El País, a Espanha enfrenta uma situação preocupante devido à decisão das autoridades chinesas de desacelerar ou, em alguns casos, interromper as importações de suínos. Este movimento já provocou uma queda dos preços na Espanha, que atingiram o seu máximo histórico de 1,60 euros por quilo vivo.

Analistas do mercado espanhol não veem uma origem clara para esta nova situação dada a pouca transparência das autoridades chinesas. Sendo assim, três possibilidades são consideradas:

recuperação do rebanho suíno seja verdadeira até que esteja novamente em torno de 400 milhões de animais, cifra semelhante à existente antes da crise de 2018, portanto não é mais necessária a maior parte do importações. A grande demanda chinesa por matéria-prima nos mercados para seu rebanho bovino sustentaria essa possibilidade.

possibilidade é que haja novos surtos de peste suína, já que muitos produtores optaram pelo abate antes de sua entrada em suas propriedades, o que significaria um aumento da oferta.

que seja um simples movimento especulativo das operadoras que dominam o mercado para baixar os preços.

Situação semelhante foi descrita na Argentina, a decisão da China de interromper a importação de carne suína dos hermanos preocupa produtores locais e exportadores da proteína, e os embarques esperados para os próximos meses permanecem em espera. “Além disso, nas últimas semanas houve queda de até 40% nos preços apresentados pelo mercado chinês, que hoje sofre uma queda sazonal da demanda e também um excesso de produção que deve ser revertido ao mercado, fato que deprime os valores domésticos”, apontou a publicação.

Exportações brasileira de carne suína

Segundo a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) as exportações de carne suína no mês de junho (considerando todos os produtos, entre in natura e processados) alcançaram 108,8 mil toneladas.

O volume supera em 13,2% o resultado alcançado no mesmo período de 2020, quando foram exportadas 96,1 mil toneladas.

Com o segundo melhor desempenho mensal da história do setor (superado apenas por março deste ano, quando foram embarcadas 109,2 mil toneladas), as exportações de carne suína em junho geraram receita de US$ 270,2 milhões, número que é recorde histórico no levantamento mensal para o setor.  O resultado supera em 36,5% o saldo das vendas de junho de 2020, com US$ 198 milhões.

De acordo com informações da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) do Governo Federal, divulgadas na semana passada, as exportações de carne suína fresca, congelada ou resfriada nos primeiros sete dias úteis de julho seguem com bom ritmo.

Ainda de acordo com a SECEX a receita obtida com as exportações de carne suína, na primeira semana de julho, US$ 77.930,671, representa 40,67% do montante obtido em todo julho de 2020, que foi de US$ 191.570,479. No caso do volume embarcado, as 31.091,507 toneladas são 34,5% do total exportado em julho do ano passado, quantia de 90.246,755 toneladas.

Vozes da cadeia produtiva suína

Para esclarecer essa movimentação da suinocultura chinesa, a SuínoBrasil consultou uma fonte da agroindústria (identidade resguardada) no país asiático.

As negociações de contratos futuros de suínos mais ativos na Bolsa Mercantil de Chicago caíram quase 17%. Impulsionando o declínio está a declaração do governo chinês de que reconstruiu rebanhos de suínos devastados pelo surto de peste suína africana em 2018. O ministério da agricultura do país agora diz que seu rebanho suíno voltou a mais de 98% dos níveis anteriores à doença – que era de aproximadamente 420 milhões de cabeças. Qual a atual composição do rebanho de suínos? A recomposição do rebanho está, de fato, em ritmo acelerado?

 

Com relação aos números atuais e a recomposição do rebanho, ninguém tem o número do atual rebanho de suínos na China. De fato, as autoridades tem divulgado que a recuperação é quase total, mas nós (agroindústria) não acreditamos que a recuperação seja total, o que tem sido notado é uma melhoria e uma diminuição no gap do rebanho antes da PSA. A produção tem se recuperado, mas com certeza, não chegou ao patamar de 98%, destacou.

 

Questionado se as negociações de mercados futuros da Bolsa de Chicago refletiu no mercado nacional o Diretor de Mercado da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Luís Rua esclarece que:

Não houve reflexos significativos. De maneira geral, o Brasil continua com uma oferta equilibrada de carne suína e as exportações seguem em alta.

No acumulado do ano aumentamos as exportações quase 20% em relação ao mesmo período do ano passado, então vemos que a demanda continua aquecida nos países que importam do Brasil. Mercados como Chile (+94%), Filipinas (+228%) e Argentina (+63%) tem demandado volumes importantes de carne suína brasileira, para além obviamente do nosso maior comprador que é a China (+29%).

No mercado interno, o retorno do auxílio emergencial, o avanço da vacinação e os preços da carne bovina nas alturas, também indicam que o segundo semestre continuará com a demanda aquecida aqui no mercado brasileiro, mesmo com a necessidade dos produtores em repassar custos em função do aumento exponencial dos principais insumos como o milho e o farelo de soja que, em algumas praças, subiram mais de 100% de um ano para o outro.

 

A China importou quase 2 milhões de toneladas de carne suína nos primeiros cinco meses de 2021, alta de 13,7% no ano, após registrar o recorde de 4,4 milhões de toneladas no ano passado. Esse declínio de contratos futuros de suínos, pode ser atribuído aos estoques de carne suína.

 

Com relação às importações é importante notar que em março e abril os volumes foram recordes, é observado sim, um pequeno declínio nos volumes importados, devido à queda dos preços da carne suína na China. Preços mais baixos no mercado e, obviamente, preços mais baixos tornam-se menos atraentes para as importadoras enviarem produtos para a China, informa a fonte.

Há especulações sobre o perfil do rebanho de matrizes “recomposição foi feita com fêmeas de 2ª ou 3ª geração, isto é, fêmeas que deveriam ser criadas como animais de engorda para frigorífico/abate e não fêmeas para reprodução que são apenas as de 1ª geração.” Há alguma informação concreta de como está sendo realizada a recomposição das matrizes na China?

As informações concretas sobre recomposição das matrizes são todas informações oficiais, que são questionáveis! Ao analisar os números históricos versus os acontecimentos do mercado, as contas não fecham! Não existe nesse momento, fora as informações oficiais nenhum dado concreto sobre a repopulação das matrizes. Vale ressaltar que é quase um consenso que a recomposição tem sido feita sim, com matrizes de segunda e terceira geração, até porque se formos entender o ciclo do suíno e o ciclo de recomposição do plantel, não haveria outra forma de realizá-lo em tempo hábil. Tudo leva a crer que a recomposição está sendo feita com matrizes de 2ª e 3ª geração, conclui.

Quem também respondeu a esse questionamento foi o Presidente do SINDICARNE-SC, José Antônio Ribas Jr.

É difícil de saber como foi realizada a recomposição de matrizes na China, há sim informações de que foram utilizadas fêmeas F2 e F3 e, não há nada de errado nessa prática, na verdade há uma aceleração no processo ao trocar uma fêmea F1 positiva, por uma fêmea F2 ou F3 negativa, que neste caso é melhor que uma fêmea positiva. Ribas ressalta que, sob a ótica genética esta não é a melhor decisão, mas deve-se analisar todo o cenário.

Com a Certificação da OIE, para os estados do Paraná, Rio Grande do Sul, Acre, Rondônia e partes do Amazonas e do Mato Grosso, como zonas livres de febre aftosa sem vacinação, já são discutidas aberturas de novos mercados, o que diminuiria a dependência das importações chinesas. A entrada de novos mercados pode assegurar os volumes das exportações brasileiras de carne suína, frente a redução de demanda da China? 

 

É importante mencionar que a China continua aumentando – quando comparados aos volumes do ano anterior – os volumes comprados do Brasil e do mundo, de maneira geral. O Brasil aumentou 29% no acumulado do ano as exportações para a China e a tendência é que terminemos o ano com volumes superiores ao que foi exportado no ano passado para o país asiático. Há muita informação no mercado, mas o que temos visto é que a China continuará importando volumes significativos nos próximos anos. Talvez não os mais de 5 milhões de toneladas que importou em 2020 e que possivelmente importará em 2021, mas talvez algo na casa das 3 milhões de toneladas.

Mas voltando à questão sobre o reconhecimento da OIE, de fato é um alento para os exportadores do Paraná e do Rio Grande do Sul. A possibilidade destes estados poderem em um futuro próximo acessarem mercados como Coréia do Sul, Japão, Filipinas, Chile e EUA contribuirá certamente para maior diversificação dos destinos para os quais o Brasil exporta. Atualmente nosso país já exporta carne suína para 95 países e continuamos trabalhando em conjunto com o MAPA e o MRE para abertura e ampliação de novos mercados. Neste caso, mais é sempre melhor”, conclui o Diretor de Mercados da ABPA, Luís Rua.

O presidente do SINDICARNE – SC, José Antônio Ribas Jr., ressalta que o mercado chinês é muito complexo de ser compreendido, primeiro pela escassez de informações e segundo pela diversidade de cenários que são criados a partir de informações teoricamente originárias da China.

O que sabemos de fato???

A suinocultura nacional continua batendo recordes de exportação, não só o estado de Santa Catarina, como Brasil. E também é fato, que no último inverno a China enfrentou dificuldades sanitárias, bem graves, que foram reportadas através dos novos casos de problema sanitário, trazendo uma percepção de impossibilidade de recuperação do plantel ao longo do ano ou pelo menos até o início do primeiro semestre de 2022.

Além disso, houveram problemas de uso ilegal de vacinas, criando um confundimento se a positividade dos novos casos de PSA serem oriundas de vírus ativos presentes nos plantéis ou de vírus inativos oriundos de vacinas ilegais. Todo esse processo acabou trazendo muitas dúvidas para o mercado.

“É muito precoce fazer qualquer leitura”, enfatiza Ribas.

“Tendo em vista que, se houve de fato a recuperação do plantel todas as notícias anteriores não foram verdadeiras. Neste caso, o mais sensato é trabalhar com dados do Ministério e das agroindústrias exportadoras. É importante manter um pouco de frieza em termos de posicionamento em relação ao mercado chinês e entender como que o mercado irá se comportar a partir de agosto/setembro”, enfatiza Ribas. 

 

O setor de proteína animal do Brasil está muito bem construído e vem buscando abertura de mercados, a China é um cliente absolutamente relevante, portanto é necessário manter uma relação em altíssimo nível. E destaca que, não devemos manter dependência só neste mercado e o Ministério tem trabalhado na abertura de novos mercados.

Além disso, o presidente do SINDICARNE destaca uma questão relevante, a busca de um mercado interno mais agressiva, participar das refeições do brasileiro muito mais presente! Este é um cenário para podermos olhar para frente!

China continuará sendo um mercado importante, continuaremos buscando novos mercados e continuaremos trabalhando no aumento de consumo per capita de carne brasileira.

Ribas finaliza destacando que, cabe a cada profissional da cadeia produtiva manter o controle sanitário das propriedades, atenção aos custos de produção, 2021 tem sido um ano desafiador com os custos de produção, e isso pode afetar a competitividade de maneira significativa, atentos a nossa oferta e demanda para que isso não gere desequilíbrios momentâneos desnecessários. Esses são os pontos chave de todo o processo, conclui.

 

Fonte: Redação SuínoBrasil, AG evolution, Canal Rural, Money Times, Pig Progress, Notícias Agrícolas, El País e Infobae.

 

Sair da versão mobile