O ministério da agricultura da China informou recentemente que seu rebanho suíno voltou a mais de 98% dos níveis anteriores ao surto de Peste Suína Africana (PSA), que dizimou mais de 40% do rebanho de suínos do país – que era de aproximadamente 420 milhões de cabeças. A recuperação vem bem antes do previsto, já que a China não estava projetada para concluir a reconstrução até 2023.
Diante dessas informações vários questionamentos foram levantados:
O país conseguiu de fato conter a doença sem vacinação?
Como ficará o mercado nacional com a retomada da produção de suínos na China?
Para responder essas e outras perguntas, preparamos uma reportagem com decisores da cadeia produtiva de suínos, além disso, há informações de fontes da agroindústria na China.
Queda dos preços na China
Segundo dados do Ministério da Agricultura e Assuntos Rurais da China, os preços da carne, do leitão e do suíno vivo estão em queda no interior da China. Em um relatório da Global Agricultural Information Network (GAIN), a equipe do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) citou a causa da queda nos preços da carne suína como resultado do ressurgimento da PSA na China no final de 2020.
Segundo o relatório: “O surto de PSA em 2020 fez com que os produtores demonstrassem maior preocupação com a propagação da doença. Como resultado, os produtores de suínos aumentaram a oferta, causando queda nos preços. Vale ressaltar que, de janeiro ao final de junho de 2021, os preços do suíno vivo registraram queda de quase 65% devido ao aumento do abate, à baixa demanda do consumidor e à abundância de carne suína no mercado.”
Analistas e pesquisadores chineses reiteraram as contribuições da PSA para a volatilidade do mercado de suínos. “Os preços foram atingidos devido ao aumento da produção após os surtos da PSA, que se move para reabastecer as reservas de carne suína do país”, destaca Wang Zuli, pesquisador adjunto da Academia Chinesa de Ciências Agrícolas (CAAS), à mídia chinesa afiliada ao estado Global Times.
Em um relatório emitido pela Reuters, Li Ming, analista da Myagric.com, ressaltou que os preços atuais do suíno de cerca de 15,6 yuans / kg (US $ 2,44) estão abaixo do ponto de equilíbrio para muitos agricultores, o que pode levar alguns à falência, e levar a um golpe substancial para fornecer mais tarde. “O risco é alto de que os mercados sejam bastante voláteis”, acrescentou.
À medida que o preço da carne suína diminuía, também observou uma redução no preço dos leitões. É relatado que as granjas de reprodução responderam com o abate de fêmeas reprodutoras menos produtivas, afetando ainda mais a produção de leitões. Os analistas esperam que a tendência diminua a população de reprodutoras para pequenos e médios produtores, ao mesmo tempo que apoia os grandes produtores com porcas de elevada eficiência.
Recorrência de PSA na China
No primeiro bimestre deste ano foram registrados casos da PSA em Hebei, Henan, Sichuan, Yunnan e Xinjiang. Recentemente, um grande número de suínos está morrendo em decorrência da PSA na principal província produtora de suínos da China, informaram agricultores e analistas, levantando preocupações de que a doença possa se espalhar ainda mais pelo sul do país e desacelerar a recuperação da produção local de carnes.
“A situação está muito séria em Sichuan recentemente”, afirmou Xiao Lin, analista do fundo de investimentos Win & Fun, de Shenzhen. A maioria dos impactados é composta por pequenos suinocultores, que relaxaram as medidas de prevenção à doença para reduzir custos após uma forte queda nos preços dos suínos nos últimos meses, acrescentou Xiao, que estimou as perdas em cerca de 10% a 15% do rebanho.
“Começou em junho e continua se espalhando”, informou um produtor no condado de Jingyan, que possuía mais de 30 matrizes suínas e centenas de animais antes de a doença atingir sua criação.
“Todos os suínos em fase de terminação contraíram a doença e morreram. Ainda há mais de cem leitões que também podem morrer”, disse ele à Reuters, pedindo para não ser identificado devido à sensibilidade do assunto.
Procurado, o Departamento Provincial de Agricultura e Assuntos Rurais de Sichuan não respondeu a um pedido de comentários.
Em fevereiro deste ano, a SuínoBrasil conversou com a Epidemiologista e Professora da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP a Dra. Masaio Mizuno, que esclareceu sobre a epidemiologia da PSA.
Caso o sistema de criação de suínos permaneça inalterado, considero praticamente impossível porque reúnem todas as condições necessárias e suficientes para a persistência da PSA, tais como:
- Elevada quantidade de javalis e outros suídeos selvagens que são reservatórios de inúmeros agentes de doenças incluindo PSA, impossíveis de qualquer atuação humana seja por razões do habitat natural, seja em razões de proteção dos animais, tema mundialmente enfrentado pelo setor de produção industrial de animais.
- Elevado números de granjas de criação informal que carecem de medidas de biosseguridade no que respeita à carente educação sanitária dos criadores; à alimentação que consiste principalmente de resíduos de alimentação humana; higiene pessoal dos colaboradores; sanitização (de instalações, objetos, veículos); notificação de ocorrência ao Serviço Veterinário Oficial (SVO) local; precário controle de pragas (roedores e moscas importantes vias de transmissão), comercialização de suínos na fase inicial da doença.
Certamente, a ocorrência de duas ou mais infecções ou doença intercorrentes principalmente em termos de saúde animal tem reflexos imediatos em razão dos prejuízos econômicos, porém mais importante é o potencial de disseminação das doenças no território chinês e países cincuncisos por se tratarem de doenças transfronteiriças, i.e, não respeitam fronteiras geográficas.
Como a PSA está ocorrendo na Europa e Ásia que são contíguos embora com diferentes níveis de incidências, os esforços para seu controle, uma vez que a erradicação se tornou impossível, o controle dependerá de um esforço conjunto respeitando as diversidades sociais, culturais, econômicas e perfil dos sistemas produtivo dos países, conclui a pesquisadora.
Cadeia global de carne suína
No fim de junho, as negociações de contratos futuros de suínos mais ativos na Bolsa Mercantil de Chicago caíram quase 17%, levando o preço para 99 centavos de dólar por libra-peso – a primeira vez que caiu abaixo de um dólar desde março. Os futuros registraram uma ligeira recuperação, subindo 3%, para US $ 1,03 a libra.
Os preços americanos de cortes de carne de suína – lombo ou costela – registraram uma queda acentuada nas últimas semanas. Os preços do lombo caíram 15% nos últimos 10 dias, enquanto as costelas caíram mais de 31%. O pernil suíno – comumente usado para churrasco – registrou uma queda de 14%, enquanto a barriga, usada para fazer bacon, caiu 18% nesse período.
Além dos Estados Unidos, a condição de preços baixos do suíno na China e recuperação do rebanho vem acendendo luzes de alerta em outros países exportadores, como Argentina e Espanha.
Analistas do mercado espanhol não veem uma origem clara para esta nova situação dada a pouca transparência das autoridades chinesas. Sendo assim, três possibilidades são consideradas:
1ª recuperação do rebanho suíno seja verdadeira até que esteja novamente em torno de 400 milhões de animais, cifra semelhante à existente antes da crise de 2018, portanto não é mais necessária a maior parte do importações. A grande demanda chinesa por matéria-prima nos mercados para seu rebanho bovino sustentaria essa possibilidade.
2ª possibilidade é que haja novos surtos de peste suína, já que muitos produtores optaram pelo abate antes de sua entrada em suas propriedades, o que significaria um aumento da oferta.
3ª que seja um simples movimento especulativo das operadoras que dominam o mercado para baixar os preços.
Exportações brasileira de carne suína
Segundo a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) as exportações de carne suína no mês de junho (considerando todos os produtos, entre in natura e processados) alcançaram 108,8 mil toneladas.
O volume supera em 13,2% o resultado alcançado no mesmo período de 2020, quando foram exportadas 96,1 mil toneladas.
Com o segundo melhor desempenho mensal da história do setor (superado apenas por março deste ano, quando foram embarcadas 109,2 mil toneladas), as exportações de carne suína em junho geraram receita de US$ 270,2 milhões, número que é recorde histórico no levantamento mensal para o setor. O resultado supera em 36,5% o saldo das vendas de junho de 2020, com US$ 198 milhões.
De acordo com informações da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) do Governo Federal, divulgadas na semana passada, as exportações de carne suína fresca, congelada ou resfriada nos primeiros sete dias úteis de julho seguem com bom ritmo.
Ainda de acordo com a SECEX a receita obtida com as exportações de carne suína, na primeira semana de julho, US$ 77.930,671, representa 40,67% do montante obtido em todo julho de 2020, que foi de US$ 191.570,479. No caso do volume embarcado, as 31.091,507 toneladas são 34,5% do total exportado em julho do ano passado, quantia de 90.246,755 toneladas.
Vozes da cadeia produtiva suína
Para esclarecer essa movimentação da suinocultura chinesa, a SuínoBrasil consultou uma fonte da agroindústria (identidade resguardada) no país asiático.
Com relação aos números atuais e a recomposição do rebanho, ninguém tem o número do atual rebanho de suínos na China. De fato, as autoridades tem divulgado que a recuperação é quase total, mas nós (agroindústria) não acreditamos que a recuperação seja total, o que tem sido notado é uma melhoria e uma diminuição no gap do rebanho antes da PSA. A produção tem se recuperado, mas com certeza, não chegou ao patamar de 98%, destacou.
Questionado se as negociações de mercados futuros da Bolsa de Chicago refletiu no mercado nacional o Diretor de Mercado da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Luís Rua esclarece que:
No acumulado do ano aumentamos as exportações quase 20% em relação ao mesmo período do ano passado, então vemos que a demanda continua aquecida nos países que importam do Brasil. Mercados como Chile (+94%), Filipinas (+228%) e Argentina (+63%) tem demandado volumes importantes de carne suína brasileira, para além obviamente do nosso maior comprador que é a China (+29%).
No mercado interno, o retorno do auxílio emergencial, o avanço da vacinação e os preços da carne bovina nas alturas, também indicam que o segundo semestre continuará com a demanda aquecida aqui no mercado brasileiro, mesmo com a necessidade dos produtores em repassar custos em função do aumento exponencial dos principais insumos como o milho e o farelo de soja que, em algumas praças, subiram mais de 100% de um ano para o outro.
Com relação às importações é importante notar que em março e abril os volumes foram recordes, é observado sim, um pequeno declínio nos volumes importados, devido à queda dos preços da carne suína na China. Preços mais baixos no mercado e, obviamente, preços mais baixos tornam-se menos atraentes para as importadoras enviarem produtos para a China, informa a fonte.
As informações concretas sobre recomposição das matrizes são todas informações oficiais, que são questionáveis! Ao analisar os números históricos versus os acontecimentos do mercado, as contas não fecham! Não existe nesse momento, fora as informações oficiais nenhum dado concreto sobre a repopulação das matrizes. Vale ressaltar que é quase um consenso que a recomposição tem sido feita sim, com matrizes de segunda e terceira geração, até porque se formos entender o ciclo do suíno e o ciclo de recomposição do plantel, não haveria outra forma de realizá-lo em tempo hábil. Tudo leva a crer que a recomposição está sendo feita com matrizes de 2ª e 3ª geração, conclui.
Quem também respondeu a esse questionamento foi o Presidente do SINDICARNE-SC, José Antônio Ribas Jr.
É importante mencionar que a China continua aumentando – quando comparados aos volumes do ano anterior – os volumes comprados do Brasil e do mundo, de maneira geral. O Brasil aumentou 29% no acumulado do ano as exportações para a China e a tendência é que terminemos o ano com volumes superiores ao que foi exportado no ano passado para o país asiático. Há muita informação no mercado, mas o que temos visto é que a China continuará importando volumes significativos nos próximos anos. Talvez não os mais de 5 milhões de toneladas que importou em 2020 e que possivelmente importará em 2021, mas talvez algo na casa das 3 milhões de toneladas.
Mas voltando à questão sobre o reconhecimento da OIE, de fato é um alento para os exportadores do Paraná e do Rio Grande do Sul. A possibilidade destes estados poderem em um futuro próximo acessarem mercados como Coréia do Sul, Japão, Filipinas, Chile e EUA contribuirá certamente para maior diversificação dos destinos para os quais o Brasil exporta. Atualmente nosso país já exporta carne suína para 95 países e continuamos trabalhando em conjunto com o MAPA e o MRE para abertura e ampliação de novos mercados. Neste caso, mais é sempre melhor”, conclui o Diretor de Mercados da ABPA, Luís Rua.
O presidente do SINDICARNE – SC, José Antônio Ribas Jr., ressalta que o mercado chinês é muito complexo de ser compreendido, primeiro pela escassez de informações e segundo pela diversidade de cenários que são criados a partir de informações teoricamente originárias da China.
O que sabemos de fato???
A suinocultura nacional continua batendo recordes de exportação, não só o estado de Santa Catarina, como Brasil. E também é fato, que no último inverno a China enfrentou dificuldades sanitárias, bem graves, que foram reportadas através dos novos casos de problema sanitário, trazendo uma percepção de impossibilidade de recuperação do plantel ao longo do ano ou pelo menos até o início do primeiro semestre de 2022.
Além disso, houveram problemas de uso ilegal de vacinas, criando um confundimento se a positividade dos novos casos de PSA serem oriundas de vírus ativos presentes nos plantéis ou de vírus inativos oriundos de vacinas ilegais. Todo esse processo acabou trazendo muitas dúvidas para o mercado.
“É muito precoce fazer qualquer leitura”, enfatiza Ribas.
“Tendo em vista que, se houve de fato a recuperação do plantel todas as notícias anteriores não foram verdadeiras. Neste caso, o mais sensato é trabalhar com dados do Ministério e das agroindústrias exportadoras. É importante manter um pouco de frieza em termos de posicionamento em relação ao mercado chinês e entender como que o mercado irá se comportar a partir de agosto/setembro”, enfatiza Ribas.
O setor de proteína animal do Brasil está muito bem construído e vem buscando abertura de mercados, a China é um cliente absolutamente relevante, portanto é necessário manter uma relação em altíssimo nível. E destaca que, não devemos manter dependência só neste mercado e o Ministério tem trabalhado na abertura de novos mercados.
Além disso, o presidente do SINDICARNE destaca uma questão relevante, a busca de um mercado interno mais agressiva, participar das refeições do brasileiro muito mais presente! Este é um cenário para podermos olhar para frente!
China continuará sendo um mercado importante, continuaremos buscando novos mercados e continuaremos trabalhando no aumento de consumo per capita de carne brasileira.
Ribas finaliza destacando que, cabe a cada profissional da cadeia produtiva manter o controle sanitário das propriedades, atenção aos custos de produção, 2021 tem sido um ano desafiador com os custos de produção, e isso pode afetar a competitividade de maneira significativa, atentos a nossa oferta e demanda para que isso não gere desequilíbrios momentâneos desnecessários. Esses são os pontos chave de todo o processo, conclui.
Fonte: Redação SuínoBrasil, AG evolution, Canal Rural, Money Times, Pig Progress, Notícias Agrícolas, El País e Infobae.