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Para líderes da suinocultura, vantagem sanitária não se sustenta sem grão competitivo e mercado interno forte

Escrito por: Priscila Beck - Diretora de Comunicação no Grupo de Comunicação AgriNews Brasil
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Para líderes da suinocultura, vantagem sanitária não se sustenta sem grão competitivo e mercado interno forte | Manifestação se deu durante painel do Pork Pinnacle 2025, em que representante do MAPA falou sobre meta de, até 2027, submeter pleito à OMSA para que o Brasil seja reconhecido como livre de Peste Suína Clássica

A suinocultura brasileira pode conquistar, até 2027, o status de país livre de PSC (Peste Suína Clássica) e, ainda assim, perder competitividade se não resolver acesso competitivo a grãos e fortalecimento do mercado interno de carne suína, dois pontos considerados decisivos pelos líderes do setor. O alerta foi feito durante o Pork Pinnacle 2025, realizado pela suínoBrasil nesta quarta-feira (26/11), em Florianópolis (SC).  

O evento foi realizado em parceria com o Sindicarne-SC e ICASA, com o patrocínio da MSD Saúde Animal, Agroceres PIC e Grupo Farenzena. No Painel “Fora da Parteira”, coordenado por José Antonio Ribas Jr., a suínoBrasil reuniu Alessandra Lacerda, auditora fiscal do MAPA, Larissa Wachholz, consultora da Vallya Agro, Marcelo Lopes, presidente da ABCS, Jorge Luiz Silva, conselheiro da ABPA e diretor do Sindicarne-SC, e Arene Trevisan, executivo da JBS na área de suprimentos. 

Segundo a representante do MAPA, o Brasil já acumula uma série de reconhecimentos sanitários na suinocultura, que confere “grande credibilidade frente aos mercados internacionais”, mas exige vigilância contínua. Ela explicou que, na zona livre de PSC, o país mantém um programa de vigilância longitudinal, com monitoramento clínico constante.  

Na área ainda não livre, o MAPA, segundo Alessandra, já colocou em prática um plano de trabalho que inclui intensificação da vigilância clínica e, a partir do próximo ano, o início de uma vigilância sorológica específica. Ela explicou que o objetivo do MAPA é usar as evidências geradas por esse trabalho para, em 2027, submeter à OMSA (Organização Mundial de Saúde Animal) o pleito para que todo o território brasileiro seja reconhecido como livre de PSC. 

Ela ressaltou que se trata de uma meta de médio prazo, condicionada à execução dos programas de campo, e que manter as zonas já livres sem reintrodução da doença é tão desafiador quanto avançar sobre a zona não livre. A auditora também chamou atenção para temas emergentes, como o mapeamento de suínos asselvajados e a necessidade de estruturar, com base técnica e suporte jurídico, eventuais ações de controle dessa população, evitando medidas pontuais que possam travar o debate em vez de avançá-lo. 

 

China 

Larissa Wachholz, ex-assessora do MAPA, trouxe ao painel a perspectiva geopolítica. Segundo ela, os planos de cinco anos da China para carne indicam que o país quer produzir cerca de 85% de toda a carne que consome e, no caso específico de carne suína e de frango, trabalha com metas de até 98% e 97% de autossuficiência, respectivamente. 

Na avaliação de Larissa, isso significa que o volume que o Brasil consegue colocar na China é importante para o exportador brasileiro, mas é marginal em relação ao consumo total chinês. Segundo ela, as políticas chinesas estão focadas em elevar produtividade, melhorar a sanidade interna e reduzir gradualmente a dependência de importações, inclusive de fornecedores tradicionais como o Brasil. 

Ela destacou que, diante desse cenário, não basta acompanhar a China à distância. O setor brasileiro precisa de presença efetiva em solo asiático, com estruturas capazes de monitorar de perto mudanças regulatórias, investigações, barreiras sanitárias e tendências de consumo.  

Larissa citou iniciativas recentes de entidades e empresas brasileiras que abriram ou estão abrindo escritórios na Ásia. Ainda assim, avaliou que o movimento é tímido frente à velocidade com que o ambiente de negócios chinês tem se digitalizado, com crescimento de comércio eletrônico, uso intensivo de tecnologia e novas formas de comunicação com o consumidor. 

Ela também lembrou que há países no Sudeste Asiático com bem menos condições do que a China para alcançar alta autossuficiência em proteína animal. Mercados como os do entorno de ASEAN (Associação de Nações do Sudeste Asiático) tendem a manter demanda estrutural por importações, e o Brasil precisa se posicionar de forma estratégica também nesses destinos, usando sua credibilidade sanitária e capacidade de oferta para diversificar a carteira de clientes. 

 

Milho, etanol e logística 

Outro ponto que apareceu de forma recorrente no debate foi o custo e a disponibilidade de milho para alimentação animal. Arene Trevisan lembrou que, hoje, cerca de 71% de todo o milho consumido para animais no Brasil é usado na região Sul, que opera com déficit de grãos. 

Segundo ele, esse desequilíbrio estrutural vem se agravando à medida que a produção de milho e a indústria de etanol de milho se consolidam no Centro-Oeste, sem que o país tenha estruturado, na mesma velocidade, soluções logísticas para abastecer o parque de suínos e aves do Sul. 

Trevisan citou que, nos últimos anos, uma parcela significativa das exportações brasileiras de milho (em torno de quase metade do volume) escoou pelo corredor Norte, direcionada diretamente ao mercado externo, sem retornar para o consumo interno. Ao mesmo tempo, ele destacou que a malha de transporte rodoviário envelhece, a disponibilidade de motoristas preocupa e o custo de deslocar grãos por longas distâncias pressiona a competitividade das fábricas no Sul. 

Na visão do executivo, tratar o milho apenas como uma variável de negociação safra a safra é insuficiente. Ele defendeu que a cadeia de suínos e aves discuta com seriedade mecanismos de contratação de longo prazo, investimentos em logística e uma leitura mais estratégica da disputa por milho com outros usos, como o etanol. 

Sem isso, avaliou, a suinocultura corre o risco de ver plantas paradas não por falta de demanda por carne, mas por falta de matéria-prima competitiva para alimentar os animais. 

 

Mercado interno 

Do lado da demanda, Marcelo Lopes levou para o painel a preocupação com o mercado interno de carne suína. Ele lembrou que, nos últimos anos, o setor obteve avanços importantes em consumo per capita no Brasil, mas insistiu que há espaço relevante para crescimento, especialmente em regiões fora do eixo Sul-Sudeste. 

Para Marcelo, se a cadeia de suínos não fizer o dever de casa em promoção de consumo, ampliação de presença no varejo e melhoria da comunicação com o consumidor, pode enfrentar, em dois ou três anos, uma “crise de compra”. Isso porque a produção já dá sinais de retomada, enquanto o trabalho coordenado sobre o mercado doméstico ainda está aquém do necessário para absorver volumes adicionais com estabilidade de preço. 

Jorge Luiz Silva reforçou a análise com dados de concentração regional. Segundo ele, mais de 80% da produção de suínos do Brasil está nos três estados do Sul, e, quando se olha para as exportações, essa participação é ainda maior. Ao mesmo tempo, citou que Santa Catarina consome, em média, cerca de 32 quilos de carne suína por habitante ao ano, enquanto o consumo nacional é de 18,8 kg e, nos Estados Unidos, ultrapassam 48 quilos per capita. 

Na avaliação de Jorge, se o Brasil conseguir elevar a média de consumo nacional para patamares mais próximos dos estados líderes e de mercados como o norte-americano, o setor “enche o documento”, ou seja, ocupa grande parte de sua capacidade produtiva com o próprio mercado interno. Para isso, ele defendeu um esforço articulado entre produção, indústria e entidades para atacar barreiras culturais, melhorar a exposição da carne suína no varejo e trabalhar de forma continuada a comunicação com o consumidor. 

Para os líderes presentes, o desafio colocado pelo Pork Pinnacle 2025 é transformar essa leitura de riscos e oportunidades em agenda concreta (institucional, empresarial e setorial) para que a suinocultura brasileira não dependa apenas da sua vantagem sanitária, mas a use como alavanca de competitividade em um cenário global cada vez mais disputado. 

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