Como a saúde intestinal pode impactar a saúde respiratória dos suínos via eixo microbiota-intestino-pulmão?

Os pulmões dos suínos possuem uma microbiota comensal cuja composição pode ser impactada por desafios ambientais como: 

  • Má qualidade do ar 
  • Alta umidade e  
  • Exposição a patógenos.  

Essas condições favorecem o desenvolvimento de doenças respiratórias, como pneumonia enzoótica e pleuropneumonia suína.  Embora a microbiota pulmonar não seja tão abundante como a intestinal, devido às diferenças relacionadas à localização, como a menor disponibilidade de nutrientes e alta concentração de oxigênio, tem sido observado que as duas estão em constante interação e uma se beneficia da outra.  

Como a saúde intestinal pode impactar a saúde respiratória dos suínos via eixo microbiota-intestino-pulmão?

Como a saúde intestinal pode impactar a saúde respiratória dos suínos via eixo microbiota-intestino-pulmão?

Mas afinal, por que a modulação da microbiota dos suínos é uma estratégia interessante?  

A resposta reside no fato de que a microbiota intestinal dos suínos não apenas coexiste com o organismo do animal, mas executa um papel fundamental em sua fisiologia e desempenho. O organismo do suíno é formado por diferentes microrganismos que superam em número as células próprias desses animais (SENDER et al, 2017).  

Estima-se que a proporção seja de aproximadamente 51% de células microbianas para 49% de células somáticas, o que já destaca a importância desses microrganismos. No entanto, a verdadeira relevância da microbiota torna-se ainda mais evidente quando analisamos o potencial genético: cerca de 90% dos genes presentes nesses animais pertencem aos microrganismos, enquanto apenas 10% são genes do próprio animal. 

A predominância genética da microbiota abre um campo vasto para intervenções estratégicas, visto que os genes microbianos são mutáveis e podem ser modulados por meio de dietas, probióticos, prebióticos ou outras ferramentas nutricionais. A plasticidade permite ajustar as funções metabólicas da microbiota, otimizando processos como digestão, absorção de nutrientes e resposta imune.  

Assim, a modulação da microbiota surge como uma ferramenta poderosa para melhorar o desempenho zootécnico, a saúde intestinal e, consequentemente, a produtividade dos suínos.  

Como a saúde intestinal pode impactar a saúde respiratória dos suínos via eixo microbiota-intestino-pulmão?

Diante da crescente pressão para a redução do uso de antimicrobianos e óxido de zinco na ração, torna-se fundamental compreender as interações entre as diferentes microbiotas do organismo suíno e seus impactos na saúde e no desempenho zootécnico. 

Portanto, entender o funcionamento do eixo microbiota-intestino-pulmão abre oportunidades para o desenvolvimento de tecnologias que modulem a microbiota pulmonar via modulação da saúde intestinal. Dessa forma, será abordado como ocorre essa interação.  

 Comunicação via ácidos graxos de cadeia curta 

A comunicação do eixo microbiota-intestino-pulmão, é mediada principalmente pelos ácidos graxos de cadeia curta (AGCCs), produtos da fermentação de fibras alimentares pela microbiota intestinal. Esses compostos, especialmente o acetato, propionato e butirato, desempenham um papel crucial na modulação da imunidade sistêmica e pulmonar, atuando como uma ponte bioquímica entre os dois órgãos.  

A produção de AGCCs ocorre no cólon, onde a microbiota fermenta fibras dietéticas, como polissacarídeos não-amiláceos e amido resistente. Após a fermentação, são absorvidos pelas células epiteliais intestinais, podendo ser utilizados como fonte de energia ou liberados na circulação sanguínea. Uma vez na corrente sanguínea, esses ácidos graxos são transportados para diversos órgãos, incluindo a medula óssea e os pulmões, mediados por transportadores específicos.  

Como a saúde intestinal pode impactar a saúde respiratória dos suínos via eixo microbiota-intestino-pulmão?

 Envolvimento do sistema imune  

Os ácidos graxos de cadeia curta (AGCCs) desempenham um papel fundamental na modulação da resposta imune, atuando em diferentes vias anti-inflamatórias.  

Na medula óssea orientam a diferenciação de macrófagos e células dendríticas, que migram para os pulmões e ajudam a reduzir inflamações.  

Nos pulmões, os AGCCs atuam de duas maneiras principais:  

  • Na redução da inflamação e  
  • Na proteção contra infecções virais. 

A primeira ocorre através do bloqueio de ativação de células do sistema imune envolvidas em reações alérgicas e inibem a produção de interleucinas inflamatórias.  

 Na segunda, os AGCCs estimulam a produção de macrófagos com ação anti-inflamatória, reduzindo a liberação de moléculas que atraem neutrófilos, evitando uma resposta inflamatória exacerbada, protegendo o tecido pulmonar.  

 Além disso, os AGCCs inibem a via inflamatória NF-κB, o que reduz a produção de citocinas pró-inflamatórias (como IL-6 e TNF-α) e aumenta a IL-10, que tem efeito anti-inflamatório. No nível molecular, eles regulam a resposta imune ao ativar receptores específicos presentes em células de defesa e do epitélio. O butirato – e, em menor grau, o propionato – também atua diretamente na regulação da expressão de genes envolvidos na proteção e recuperação dos tecidos. 

Outro ponto importante é que os AGCCs ainda influenciam a imunidade adaptativa, especialmente em respostas a patógenos como o vírus da influenza.  

Estudos recentes demonstram que esses metabólitos modulam a atividade de células T e B, impactando a produção de anticorpos neutralizantes, sendo essa modulação importante para uma resposta imune específica e eficaz contra infecções virais. 

Como a saúde intestinal pode impactar a saúde respiratória dos suínos via eixo microbiota-intestino-pulmão?

 Translocação de bactérias para os pulmões é sempre doença? 

Tendo em vista que a microbiota intestinal está em constante comunicação com os pulmões, especialmente via produção de AGCCs e modulação do sistema imune, fica a dúvida se a translocação, ou seja, a chegada de bactérias da microbiota intestinal nos pulmões, é algo positivo.  

Geralmente essa translocação é associada apenas a eventos adversos, onde existe um desafio prévio capaz de superar as capacidades de resistência e resiliência das microbiotas do organismo, fenômeno chamado de disbiose. Nesse caso, a microbiota intestinal disfuncional somada a falta de integridade da barreira intestinal e incapacidade do sistema imune, podem resultar na migração de bactérias patogênicas nos pulmões. 

Como a saúde intestinal pode impactar a saúde respiratória dos suínos via eixo microbiota-intestino-pulmão?

Porém, esse não é o único cenário no qual bactérias intestinais translocam para os pulmões.  

Essa comunicação mais direta do eixo microbiota-intestino-pulmão também pode acontecer em suínos saudáveis, no ponto máximo de desempenho, de maneira benéfica com o potencial de proteger o sistema respiratório desses animais contra os desafios que podem aparecer.  

 Translocação de bactérias também é saúde 

O ambiente pulmonar não é tão abundante em disponibilidade de nutrientes como o ambiente intestinal e ainda possui elevadas concentrações de O2, sendo um local hostil para a maioria das bactérias relacionadas à saúde intestinal. Apesar disso, em alguns momentos o organismo utiliza desse mecanismo a seu favor ao permitir a translocação de alguns microrganismos do intestino para os pulmões, o que acontece quando suínos saudáveis passam por um desafio respiratório primário.  

Em estudo realizado por Yang et al. (2024), leitões desmamados foram submetidos à um desafio ambiental com concentração tóxica de amônia, que é lesivo para a mucosa respiratória, para testar se probióticos do gênero Lactobacillus translocariam para os pulmões. Foi observado nas análises pulmonares que os animais suplementados com esses probióticos via ração tinham maior abundância dessas bactérias, além de possuírem bons resultados de desempenho. Esse foi o primeiro estudo a demonstrar que é possível suplementar leitões com probióticos para colonização dos pulmões, sendo um assunto ainda a ser explorado. 

A forma como ocorre essa translocação pode ser bem semelhante à que ocorre pela via êntero-mamária da microbiota do leite, assunto já abordado na SuínoBrasil pela equipe ASIH.  

Dessa forma, é possível que as células dendríticas posicionadas na parede dos intestinos façam a seleção de bactérias benéficas e carreguem elas via sistema linfático ou sanguíneo até alcançarem os pulmões, onde serão liberadas.  

Como a saúde intestinal pode impactar a saúde respiratória dos suínos via eixo microbiota-intestino-pulmão?

Como a saúde intestinal pode impactar a saúde respiratória dos suínos via eixo microbiota-intestino-pulmão?

 Possíveis tecnologias para potencializar a comunicação intestino-pulmão 

A inclusão de probióticos na dieta de suínos pode ser uma ferramenta eficaz para melhorar o desempenho dos animais em situações de desafios respiratórios devido à maior produção de AGCCs, mediadores essenciais do eixo microbiota-intestino-pulmão. Além disso, a suplementação com probióticos pode ajudar a restaurar os níveis de AGCCs durante episódios de disbiose, comum em animais com comprometimento do trato gastrointestinal ou respiratório. 

No campo da pesquisa, torna-se promissora a execução de estudos que procurem probióticos com alta capacidade de translocação do intestino para os pulmões de maneira benéfica.  

Após isso, é necessário conhecer exatamente o que essas bactérias normalmente associadas ao intestino podem realizar nos pulmões (será que elas continuam produzindo os mesmos metabólitos? Competem com microrganismos patogênicos? Ou assumem funções novas?).  

Esses são passos importantes que representam um enorme potencial para favorecer a saúde intestinal e respiratória dos suínos, melhorando o desempenho com redução da ativação do sistema imune e redução no uso de antimicrobianos.  

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