A evolução na genética de suínos, especialmente das fêmeas, trouxe para o sistema de produção, animais com uma capacidade reprodutiva melhorada que possibilitou um aumento no número de leitões nascidos. No cenário nacional, observa-se que o número médio de leitões nascidos vivos por fêmea/ano aumentou de 27,22 em 2008 para 31,02 leitões em 2019 (AGRINESS, 2020).
Ainda de acordo com os relatórios da Agriness, houve uma redução de 100 g/ leitão no peso médio ao nascimento para o mesmo período.
Aliado à essas características do cenário brasileiro, a prática de desmame precoce entre 21 e 28 dias de idade permite um melhor aproveitamento das instalações nas granjas (XUE et al., 1993).
Contudo, o manejo dos leitões na maternidade se torna ainda mais desafiador, pois além de existir uma maior proporção de leitões leves que necessitam de maiores cuidados iniciais, a produção de leite pela porca é insuficiente para atender a demanda das leitegadas numerosas. Portanto, é fundamental que sejam aplicadas estratégias de manejo como o uso do creep feeding, com o objetivo de minimizar o impacto do déficit em produção de leite e preparar a leitegada para o período de transição entre as fases de maternidade e creche.
Fisiologia do trato gastrointestinal x desmame dos leitões
O peso ao desmame é um fator determinante para o desempenho subsequente dos leitões. Segundo resultados observados por Kummer et al., (2009) um desempenho satisfatório na terminação está intimamente relacionado com o desempenho dos animais na fase de creche, especialmente na primeira semana após o desmame. Naturalmente, o desmame em suínos acontece em torno de 10 a 12 semanas de idade, de maneira gradual e corresponde com o desenvolvimento quase que completo do sistema epitelial, imunológico e nervoso do trato gastrintestinal (MOESER et al., 2017).
É um período considerado como um dos mais críticos e desafiadores, pois os leitões são submetidos à diferentes fontes de estresse. São mudanças marcantes, tais como:
- separação materno-filial e mistura de lotes;
- adaptação às novas instalações e ao ambiente; e
- o consumo de uma dieta sólida (PLUSKE et al.,1997; WEARY et al., 2008).
Durante a amamentação, os leitões
ingerem o leite da porca que é rico em
gordura, lactose e caseína e a composição
química característica dessa secreção é
compatível com a fisiologia digestiva dos
animais nesse período (LALLÈS et al., 2004).
Ao serem desmamados, passam a ingerir um alimento sólido e seco, pouco digestível, composto por proteína vegetal, amido e óleo. No entanto, não possuem um sistema digestório adequadamente desenvolvido para o melhor aproveitamento desses nutrientes e, consequentemente, expressam um baixo desempenho (LANGE et al., 2010; KIM et al., 2012).
As vilosidades revestem o epitélio do intestino e amplificam a área de superfície para o processo de digestão e absorção de nutrientes enquanto as criptas localizadas na base das vilosidades, possuem células importantes para a renovação celular constante do epitélio (ZHANG & XU, 2006).
O funcionamento ideal do intestino delgado está relacionado com vilosidades longas, porém, após o desmame há um período de atrofia das vilosidades e hiperplasia das criptas no intestino dos leitões e a principal razão para essas alterações se dá pelo baixo consumo de ração.
Nas primeiras semanas de vida, o sistema digestório dos leitões é eficiente em digerir, principalmente, o açúcar do leite da porca pela alta atividade da enzima lactase. O período de desmame corresponde com uma queda na atividade da lactase e um aumento gradativo das enzimas lipase, protease e amilase, em razão do aumento dos níveis de gorduras, proteínas e carboidratos na dieta (CHAMONE et al., 2010).
Ainda de acordo com os mesmos autores, nesse momento os leitões são incapazes de manter um baixo valor de pH devido a insuficiente produção de ácido clorídrico. Dessa forma, a elevação do pH estomacal favorece a proliferação de bactérias patogênicas como Escherichia coli e a diminuição da digestão e absorção de nutrientes, principalmente proteínas.
Neste sentido, algumas estratégias podem ser adotadas no pré-desmame para melhorar o desempenho e a uniformidade da leitegada. A principal característica desse momento de transição entre a maternidade e a creche é a fonte e a forma física do alimento dos leitões, ou seja, deixam de consumir o leite materno, um alimento líquido de alta digestibilidade, para consumir uma dieta sólida de menor digestibilidade (CAMPBELL et al., 2013).
Uma das estratégias mais adotadas nas granjas é o fornecimento de dietas sólidas (creep feeding) para os leitões lactentes ainda na maternidade. Os principais benefícios conferidos à essa prática são de fornecer uma dieta com ingredientes altamente digestíveis, para que o consumo seja antecipado e haja uma adaptação intestinal precoce aos nutrientes que não estão presentes no leite, além de fornecer uma nutrição suplementar (SHEA et al, 2013).
Uma das estratégias mais adotadas nas granjas é o fornecimento de dietas sólidas (creep feeding) para os leitões lactentes ainda na maternidade. Os principais benefícios conferidos à essa prática são de fornecer uma dieta com ingredientes altamente digestíveis, para que o consumo seja antecipado e haja uma adaptação intestinal precoce aos nutrientes que não estão presentes no leite, além de fornecer uma nutrição suplementar (SHEA et al, 2013).
O estímulo ao consumo é uma das principais justificativas para o fornecimento do creep feeding no pré-desmame. De acordo com os resultados observados por Bruininx et al., (2002), leitões que consomem ração na maternidade, demoram menos tempo para se alimentarem após o desmame sugerindo que, o estímulo ao consumo precoce favorece o consumo na fase de creche (Figura 1).
Fornecimento do creep feeding aos leitões
De maneira geral, segundo Eastwood (2018), algumas características são importantes para o sucesso dessa estratégia e para maximizar o consumo do creep feeding como:
As dietas complexas para leitões recém desmamados utilizam ingredientes de alta palatabilidade e digestibilidade como, por exemplo, plasma sanguíneo, lácteos e farinha de peixes. Da mesma forma, a formulação de uma ração de creep feeding deve levar em consideração a fisiologia intestinal imatura do leitão lactente.
O fornecimento precoce do creep feeding pode ser vantajoso para o desempenho dos leitões lactentes. Nesse sentido, Lee e Kim (2018) observaram que o fornecimento do creep feeding na maternidade sete dias após o nascimento comparado ao fornecimento 14 e 21 dias após o nascimento dos leitões, aumenta o peso corporal e o ganho de peso médio diário dos animais.
Os autores sugerem que uma duração mais longa do creep feeding pode melhorar o desempenho dos leitões.
O tipo de comedouro utilizado nesse manejo também pode influenciar o consumo e a quantidade de desperdício de ração. Os comedouros do tipo bandeja, por exemplo, permitem que vários animais possam consumir ao mesmo tempo. A escolha de um comedouro adequado deve prevenir que os leitões urinem e defequem, fuçam ou se deitem sobre a ração fornecida.
Segundo Sulabo et al., (2010b) o comedouro circular com aro divisor e reservatório demonstra ser mais adequado e indicado para fornecer o creep feeding, pois a presença do reservatório dificulta a entrada e permanência dos leitões dentro do comedouro, evitando assim que os animais fucem, urinem ou defequem na ração, reduzindo o desperdício.
Diâmetro do pellet
É comum observar em granjas comerciais o fornecimento da ração do creep feeding em forma de pellets. Geralmente o pellet é muito pequeno, com aproximadamente 3 milímetros de diâmetro ou menor. Essa é uma característica física da ração que também pode influenciar o consumo dos leitões.
Uma série de estudos foram conduzidos por van den Brand et al., (2014) para avaliar o efeito do tamanho do pellet da ração fornecido no creep feeding de leitões a partir da primeira semana após o nascimento.
Foram oferecidos pellets de tamanho considerado padrão, com 2 a 3 mm comparados aos pellets considerados grandes, com 10 a 12 mm de diâmetro.
Os autores observaram que, quando os leitões tem a oportunidade de escolher, preferem os pellets de maior diâmetro e consomem mais ração. Observaram também o mesmo comportamento no consumo quando foi oferecido apenas uma opção de tamanho do pellet. A partir disso, concluíram que após o desmame o consumo de ração e o ganho de peso foram superiores para os leitões que consumiram os pellets grandes durante a lactação.
A quantidade de ração consumida pelos leitões na maternidade é muito variada e nem sempre irá refletir em melhorias de desempenho após o desmame. Os leitões que têm acesso ao creep feeding durante a lactação demonstram um aumento no consumo de ração e ganho de peso durante os primeiros dias após o desmame, mas segundo alguns autores, essa vantagem não se mantém até o final da fase de creche (LAWLOR et al., 2002; SULABO et al., 2010c ; VAN DEN BRAND et al., 2014).
Conclusão
Diante disso, devemos considerar que, embora seja frequentemente utilizado como estratégia para melhorar o desempenho dos leitões na maternidade ou de adaptação às dietas sólidas do pós-desmame, os resultados disponíveis em relação ao creep feeding ainda são inconsistentes. Isso se deve a diferentes fatores, principalmente, pela alta variação no consumo entre os leitões. Tanto em granjas comerciais quanto em avaliações experimentais, o início do fornecimento e a quantidade de ração consumida do creep feeding têm sido muito variadas, e geralmente muito baixa (WATTANAKUL et al., 2005).
Portanto, é fundamental se atentar não só para a qualidade da dieta oferecida, mas também para a forma física da ração e o tipo de comedouro a ser utilizado. Esses fatores podem ser determinantes no sucesso deste manejo. O fornecimento precoce de ração suplementar ao leite da porca pode antecipar o contato dos leitões com os alimentos sólidos e estimular um maior consumo logo após o desmame.
Esse tipo de estratégia deve estar alinhado com os manejos de desmame, formulação de dietas e uso de aditivos para que se possa alcançar os melhores resultados de desempenho e saúde dos animais.