Influenza Aviária: Qual a ameaça para a suinocultura brasileira?

A chegada da influenza aviária de alta patogenicidade (IAAP) ao sistema de produção pecuário global trouxe novos desafios para a sanidade animal. Esse vírus, pertencente ao tipo influenza A, possui caráter zoonótico, ou seja, pode infectar aves, mamíferos domésticos, silvestres, animais de companhia e até seres humanos.

No Brasil, a suinocultura deve permanecer em alerta, uma vez que os suínos representam uma espécie-chave na dinâmica de recombinação viral.

O suíno como “mixing vessel” e a disseminação global da IAAP

Os suínos possuem receptores celulares capazes de reconhecer tanto vírus de origem aviária quanto de mamíferos, inclusive humanos.

 

Isso confere à espécie a característica de “mixing vessel” (vasos de mistura) – ou seja, um hospedeiro em que diferentes vírus de influenza podem se recombinar. Quando duas variantes infectam a mesma célula, seu material genético segmentado pode se rearranjar, originando novas combinações virais, potencialmente mais adaptadas e transmissíveis.

Esse fenômeno é particularmente preocupante diante da circulação de diferentes subtipos no mundo. O clado 2.3.4.4b do vírus H5N1, que surgiu em 2013, já se espalhou da Europa para Ásia, América do Norte, América do Sul e até Antártica, alcançando uma distribuição global inédita. A proximidade entre as cadeias de aves e suínos (ou mesmo bovinos de leite) no Brasil, principalmente na região Sul, aumenta a possibilidade de contato indireto com o vírus. Compartilhamento de transportes, ração e estruturas produtivas são fatores que elevam o risco.

No Brasil, a ameaça torna-se mais concreta devido a fatores estruturais do sistema de produção:

  • Convivência próxima de aves e suínos, especialmente nas regiões Sul, onde as mesmas empresas atuam em ambas as cadeias;
  • Alto grau de movimentação e mistura de animais, característica do modelo comercial de produção intensiva;
  • Prevalência elevada de influenza suína, já endêmica no país, com estimativas de soropositividade em cerca de 70% dos plantéis;
  • Transmissão aérea e ambiental, uma vez que o vírus é altamente infeccioso e persistente em condições ambientais desfavoráveis.

O maior risco é a ocorrência de rearranjos entre o vírus aviário e o vírus suinícola endêmico, possibilitando o surgimento de uma variante com maior eficiência de replicação e capacidade de transmissão entre suínos – e, potencialmente, para humanos.

 

Lições de outros sistemas de produção

Experiências recentes mostram a complexidade do controle. Nos Estados Unidos, surtos de influenza aviária resultaram em elevada mortalidade de aves comerciais e na necessidade de abate sanitário em larga escala.

Mesmo com compensações financeiras aos produtores, falhas em protocolos de biosseguridade permitiram a manutenção do vírus em circulação. Casos inesperados de infecção em bovinos leiteiros reforçam a capacidade de adaptação viral, possivelmente facilitada por práticas de manejo (compartilhamento de recursos hídricos, ordenhadeiras contaminadas, dentre outros).

Recomendações para prevenção da IAAP em granjas de suínos

  • Controle de acesso à propriedade
    • Quarentena para visitantes internacionais.
    • Proibição de entrada de pessoas que visitaram outras propriedades (avícolas, leiteiras ou suínas).
    • Registro de entrada e saída.
    • Protocolos obrigatórios de espera e desinfecção.
  • Uso de EPIs e desinfecção
    • EPIs obrigatórios: botas, macacões e luvas descartáveis.
    • Desinfecção de veículos, ferramentas e materiais na entrada e saída.
  • Água e alimentação seguras
    • Utilizar apenas água tratada para bebedouros e higienização.
    • Proibição do uso de água de rios, lagoas ou açudes.
    • Proibição do uso de leite cru como suplemento alimentar para suínos.
  • Barreiras físicas contra animais
    • Instalação de telas, cercas e galpões vedados.
    • Impedir contato com aves silvestres e animais carniceiros (gambás, raposas, roedores).
    • Prevenir acesso de javalis ou suídeos asselvajados.
  • Vigilância ativa e resposta rápida
    • Coleta de amostras de suínos sintomáticos e assintomáticos para testes (subtipagem e sequenciamento genético).
    • Monitoramento de mutações e variantes com potencial zoonótico.
    • Plano de ação emergencial: isolamento, notificação e contenção em casos suspeitos ou confirmados.
  • Capacitação e conscientização
    • Treinar funcionários e produtores sobre riscos do H5N1.
    • Explicar formas de transmissão e importância do cumprimento das medidas de biossegurança.
  • Integração Saúde Única (One Health)
    • Reforçar o papel dos produtores na vigilância epidemiológica.
    • Recomendar vacinação para gripe anualmente para funcionários e produtores.

 

Considerações finais

A influenza aviária de alta patogenicidade é um vírus que “chegou para ficar” no cenário global.

No Brasil, a proximidade entre cadeias produtivas, a alta densidade animal e a circulação endêmica de influenza suína configuram um ambiente propício para eventos de recombinação.

Assista a entrevista completa:

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