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26 ago 2020

Longevidade da matriz suína: Qual é o impacto econômico sobre o sistema produtivo?

A longevidade das matrizes suínas é um dos pontos cruciais para a garantia da eficiência do sistema produtivo de suínos.
A redução da longevidade pode levar à ineficiência econômica do sistema produtivo, pois o rebanho reprodutivo corresponde aos animais de maior valor dentro do plantel da granja.
O Professor da USP, Dr. Cesar Garbossa, esclarece questões econômicas relacionadas à longevidade da matriz suína! Confira o artigo completo!

Longevidade da matriz suína: Qual é o impacto econômico sobre o sistema produtivo?

A longevidade das matrizes suínas é um dos pontos cruciais para a garantia da eficiência do sistema produtivo de suínos.

A redução da longevidade pode levar à ineficiência econômica do sistema produtivo, pois o rebanho reprodutivo corresponde aos animais de maior valor dentro do plantel da granja. Neste sentido, a garantia da longevidade das fêmeas é fundamental, no entanto, a taxa de descarte de porcas tem aumentado constantemente, o que sugere que a longevidade diminuiu nos últimos anos.

Aproximadamente 40 a 50% das matrizes são descartadas após produzir apenas uma ou duas leitegadas, período em que as matrizes ainda não atingiram sua produtividade máxima e os custos iniciais de reposição ainda não foram recuperados (Carroll, 2011; Stalder et al., 2003).

 

As taxas médias anuais de reposição de rebanhos reprodutores em sua maioria ultrapassam 50% e, da mesma forma, as taxas médias anuais de abate e mortalidade de porcas aumentaram.

 

A porca que permanece no rebanho reprodutor por um menor período provavelmente produzirá menos animais em sua vida, em comparação com uma porca que permanece no rebanho reprodutor por um longo período.

Isso reduz a oportunidade de uma porca ser produtiva (suínos desmamados e vendidos por toda a vida) para obter retorno sobre o custo do investimento em reposição (Stalder et al., 2004).

Existem relatos (Pond & Mersmann, 2001) de que a longevidade natural de suínos é de 12 a 15 anos, quando o desempenho não é um fator na remoção do rebanho reprodutor.

A baixa longevidade, independentemente das causas, resulta no aumento das taxas de substituição das fêmeas dos rebanhos reprodutores.

 

Além disso, a baixa longevidade resultará na necessidade de maiores pools de animais, consequentemente será necessário que o sistema de produção de carne suína crie ou compre essas marrãs. Além do custo inicial de compra ou de oportunidade das fêmeas de reposição, um produtor incorre em despesas adicionais associadas ao desenvolvimento e adaptação de marrãs de substituição.

Existe um risco de doença quando os animais são introduzidos no rebanho reprodutor.

 

Reduzir o número de animais e a frequência de introdução de animais pode reduzir o risco de introdução de doenças que não estão atualmente presentes nas operações com suínos.

Em alguns casos, a menor produção materna de porcas mais jovens, embora não seja uma despesa direta, reduz o rendimento bruto de uma operação de suínos quando comparada à produção de porcas mais maduras (Lucia et al., 1999).

 

Taxas elevadas de descarte de matrizes são uma preocupação para os produtores de suínos, pois afetam a lucratividade e a eficiência da produção, somado a isso podem representar problemas associados ao bem-estar animal, uma vez que algumas causas de abate e mortalidade podem indicar que um animal pode estar sob uma situação de menor bem-estar animal (Barnett et al., 2001).

Além disso, a baixa longevidade resultante de altas taxas de abate e mortalidade pode impactar a percepção do consumidor sobre a indústria suinícola e a aceitabilidade do consumidor pelas práticas modernas de produção de suínos.

Aproximadamente 70% das remoções de porcas são o resultado de descarte prematuro e não planejado devido a razões como falha reprodutiva e problemas nos membros (Engblom et al., 2011).

Nos Estados Unidos da América e União Europeia, entre 43 a 54% das matrizes reprodutoras são removidas anualmente; e, a paridade média de remoção varia de 3,3 a 4,6 (Boyle et al., 1998; D’Allaire et al., 1987; Dijkhuizen et al., 1989; Engblom et al., 2007; Lucia et al., 2000).

Existem países europeus como a Dinamarca, onde enviar para o abate matrizes suínas com problemas de membros locomotores é considerado um crime, levando a um aumento na mortalidade de porcas na granja devido à eutanásia e ao aumento dos custos veterinários (Boyle et al., 2012).

É provável que, no futuro, outros países da União Europeia e até mesmo outras regiões do mundo também implementem legislação semelhante, que pode ter implicações financeiras enormes para os produtores de suínos. Além disso, o produtor incorre em despesas adicionais associadas ao desenvolvimento e adaptação de marrãs de reposição (Stalder et al., 2000).

Simulação Bioeconômica 

Faust et al. (1992, 1993) desenvolveram modelos de simulação bioeconômica de um sistema de criação de suínos para determinar os efeitos de várias características na lucratividade, incluindo o descarte.

Os resultados demonstraram que os sistemas de criação de suínos com as menores taxas de reposição (maior longevidade) foram os mais rentáveis.

 

 

Eles também demonstraram que com baixas taxas de reposição, as marrãs valem até 450% do valor de mercado.

No entanto, com altas taxas de reposição, o valor das marrãs de reposição não teve mais de 175% de impacto, pois melhorou o conteúdo de carne magra em 0,5%.

Parson et al. (1990) sugeriram que a produtividade de um rebanho estável de suínos (estável em termos de tamanho) e seu status econômico não foram afetados pela distribuição da paridade e suas estratégias de descarte, no entanto, os autores realizaram comparações entre rebanhos em que a porcentagem de porcas de ordem de parto 1 era de aproximadamente 30%, porcentagem muito menor em comparação às taxas atuais de reposição de 50% nos rebanhos comerciais.

 

Como demonstrado é de vital importância identificar e entender os diferentes fatores e/ou práticas que afetam a longevidade da porca, e assim determinar o momento ideal de descarte das matrizes suínas a fim de maximizar a lucratividade do sistema produtivo.

Dessa forma, Garbossa e Azevedo (2020) desenvolveram um modelo bioecônomico para determinar o valor presente líquido (VPL), de acordo com a ordem de parto das matrizes frente a diferentes cenários do mercado e índices produtivos.

CENÁRIOS

Os cenários considerados pelos pesquisadores foram:

5% de piora para a variação do preço de compra da marrã;

variação do preço de venda dos suínos;

variação do preço da ração; e

variação no número de leitões nascidos para uma granja de ciclo com capacidade de 5000 matrizes.

O número total de porcas e partos/porca/ano foram mantidos constantes, a taxa de reposição foi calculada como compra de marrãs sobre o estoque alojado por distribuição de ordem de partos. A perda por mortes e os descartes por falta de concepção foram considerados no cálculo das compras de marrãs necessárias para manter o rebanho reprodutor.

Na figura 1 são apresentados os dados de avaliação do valor presente líquido das marrãs nos cenários:

atual

aumento de 5% no custo de compra da marrã;

redução em 5% no número de leitões nascidos vivos;

aumento de 5% no custo da dieta; e

diminuição em 5% no preço de venda do suíno cevado, evidenciando que o fator que traz maior impacto sobre o VPL da marrã é o preço de venda do animal cevado.

Figura 1. Valor presente líquido (VPL) das marrãs nos cenários: atual; aumento de 5% no custo de compra da marrã; redução em 5% no número de leitões nascidos vivos; aumento de 5% no custo da dieta e diminuição em 5% no preço de venda do suíno cevado

Para o cenário atual a marrã se paga com 2,14 partos;

Com o aumento de 5% no custo de compra da marrã, o animal se paga com 2,27 partos;
Com a redução em 5% no número de leitões nascidos vivos, se paga com 2,66 partos
Para o aumento de 5% no custo da dieta, se paga com 2,71 partos; e

Para a diminuição em 5% no preço de venda do suíno cevado se paga com 2,92 partos.

Ainda vale ressaltar que, biologicamente, para todos os cenários, as fêmeas só possuem VPL positivo a partir do terceiro parto, ou seja, é de extrema importância que as fêmeas sejam mantidas no plantel até o terceiro parto, pois é o momento onde as fêmeas se tornam lucrativas para o produtor.

DESCARTE PRECOCE

O descarte precoce é associado a prejuízos para o produtor, pois as fêmeas reprodutoras devem ser mantidas no rebanho até que pelo menos o custo do investimento inicial associado à sua substituição seja recuperado, o que de acordo com Stalder et al. (2003) e Carroll (2011) só ocorre após o terceiro parto, semelhante ao que foi encontrado por Garbossa e Azevedo (2020).

Somado a esse fato, de acordo com King et al. (1998), à medida que a porcentagem de marrãs no estoque aumenta em 1%, o número médio de dias não produtivos (DNP) aumenta em 2,6 dias.

Dessa forma, sabe-se que o número de partos necessários para recuperar o investimento inicial varia de acordo com o sistema de produção e quanto maior for o seu tempo de permanência, mais diluído serão os custos de reposição.

 

Além do aumento dos DNPs, a alta taxa de remoção aumenta a entrada de marrãs no rebanho, resultando em menor tamanho médio da leitegada e menor número de leitões desmamados por porca por ano (Hughes e Varley, 2003).

Adicionalmente, os leitões das marrãs são mais leves ao nascer e ao desmame e têm maior risco de mortalidade e suscetibilidade a doenças em comparação aos leitões produzidos a partir de matrizes mais velhas (Smits, 2011).

CUSTOS DE ALIMENTAÇÃO

Ainda, como o rebanho de matrizes é responsável por aproximadamente 20% dos custos de ração em granja comercial de ciclo completo, a menor taxa de remoção pode ter efeito direto na conversão alimentar do rebanho devido ao consumo de ração de leitoas de reposição, mantidas por 6-12 semanas antes da primeira cobertura (Smits, 2011).

 

Reis et al. (2001) e Oiagen et al. (2006) salientam que os produtores independentes são extremamente dependentes do preço das commodities – no caso da suinocultura, pode-se dizer soja e milho, que são as principais matérias primas na alimentação dos animais.

Entretanto, o mesmo não pode ser controlado pelos gestores rurais, o que faz o custo de produção ser ainda mais importante, para obtenção de sucesso dentro do sistema produtivo das propriedades.

Se o produtor não consegue controlar o preço da base alimentar de seu plantel, que equivale a cerca de 80% dos custos de produção (EMBRAPA, 2020), faz-se necessário gerenciar todos os outros gastos com a produção desses animais.

A variação do preço de venda do suíno cevado demonstrou o maior impacto sobre o VPL da marrã.

Esse é um fator bastante preocupante para a cadeia produtiva, pois os produtores não têm influência sobre o preço de venda dos animais que são produzidos em sua maioria em lotes semanais.

Ainda, deve-se ressaltar que a atividade produtiva primária é o setor mais vulnerável da cadeia agroindustrial, devido à pressão de competição e às limitações tecnológicas e de gestão.

O produtor necessita controlar as variáveis envolvidas em seu sistema, uma vez que o preço do produto que vende não é controlado por ele. Trata-se de traçar uma estratégia a fim de tornar seu produto competitivo, diminuindo seus custos produtivos e aumentando sua produtividade, e consequentemente, sua margem de lucro (Reis et al., 2001).

RENTABILIDADE DAS FÊMEAS

De uma forma geral, para todas as simulações observa-se que conforme as fêmeas permanecem mais tempo no plantel, elas se tornam mais rentáveis, pois diluem seus custos de aquisição, de forma semelhante ao observado por Faust et al. (1992, 1993), através da avaliação de modelos de simulação bioecônomico observaram que os sistemas de criação de suínos com as menores taxas de reposição foram os mais rentáveis.

A distribuição por ordem de parto de um rebanho reprodutor indica quando é mais provável que as porcas sejam removidas, pois influencia o desempenho biológico e econômico do rebanho.

 

Pinilla e Lecznieski, (2014) definiram a distribuição de ordem de parto “ideal” como uma função matemática da:

taxa de remoção de porcas;

disponibilidade de marrãs;

preço de mercado de cevados; e

custos de alimentação.

 

De acordo com D’Allaire et al. (2012), a distribuição de ordem de parto “ideal” para um rebanho reprodutor é função do número máximo de partos que as porcas são capazes antes que ocorra o abate automático devido à taxa anual de reposição.

E, uma vez que esses dois valores sejam conhecidos, a distribuição ou porcentagem de porcas abatidas em cada ordem de parto é uma função linear.

 

A distribuição de ordens de parto ideal é essencial para manter um desempenho consistente da produção e evitar flutuações no número de marrãs de reposição. No entanto, de acordo com Dial et al. (1992) é difícil estabelecer uma distribuição de paridade “ideal”, porque isto pode variar entre granjas, pois depende de certas características da propriedade, como linhagem, custo de reposição, tipo de instalações e habilidades de criação (D’Allaire et al., 2012).

Para atingir esses objetivos, é necessário minimizar o abate de fêmeas mais jovens do rebanho, independentemente da razão de remoção ou abate.

Como observado quanto mais tempo a longevidade das matrizes suínas no plantel maior será o retorno sobre o investimento (compra da marrã) do produtor, porém deve-se considerar que a manutenção de animais de maiores ordens de parto no plantel é desafiadora. O preço pago pelo kg de animal terminado foi a variável que mais impactou sobre o valor presente líquido da marrã, dessa forma, se faz necessário que os suinocultores se organizem em associações como forma de melhorar a capacidade de barganha junto às plantas frigoríficas.

 

Relacionado com Custos de produção
Sectoriales sobre Custos de produção
país:1950

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